18 novembro 2008

Autorretrato

Dedo de prosa.
Unha de fome.
Pé de moleque.
Joelho de cano.
Perna de pau.
Cadeira de balanço.
Tronco de artéria.

Mão de vaca.
Dor de cotovelo.
Braço de rio.
Ombro de amigo.
Papo de anjo.
Fio de bigode.
Barba de molho.
Boca de santo.
Dente de leite.
Nariz de avião.
Ouvido de tuberculoso.
Olho de lince.
Testa de ferro.
Memória de elefante.
Cabeça de vento.
Entrada de graça.
Aeroporto de mosquito.

05 agosto 2008

Viagem

somewhere i have never travelled
Edward Estlin Cummings

somewhere i have never travelled, gladly beyond
any experience, your eyes have their silence:
in your most frail gesture are things which enclose me,
or which i cannot touch because they are too near

your slightest look easily will unclose me
though i have closed myself as fingers,
you open always petal by petal myself as Spring opens
(touching skilfully, mysteriously) her first rose

or if your wish be to close me, i and
my life will shut very beautifully, suddenly,
as when the heart of this flower imagines
the snow everywhere carefully descending;

nothing which we are to perceive in this world equals
the power of your intense fragility: whose texture
compels me with the colour of its countries,
rendering death and forever with each breathing

(i do not know what it is about you that closes
and opens; only something in me understands
the voice of your eyes is deeper than all roses)
nobody, not even the rain, has such small hands


num lugar ao qual eu nunca viajei

num lugar ao qual eu nunca viajei, alegremente além
de qualquer experiência, teus olhos têm seu silêncio:
no teu gesto mais frágil há coisas que me abarcam,
ou que eu não posso tocar porque estão muito próximas

o teu mais leve olhar me abrirá facilmente
embora eu me tenha fechado como dedos,
tu sempre me abres pétala por pétala como a Primavera abre
(tocando habilmente, misteriosamente) sua primeira rosa

ou se teu desejo for de fechar-me, eu e
minha vida nos fecharemos graciosamente, repentinamente,
como quando o coração dessa flor imagina
a neve caindo cuidadosamente por toda a parte;

nada que possamos perceber neste mundo se iguala
à força da tua intensa fragilidade: cuja textura
me compele com a cor de seus países,
retratando a morte e o sempre a cada suspiro

(eu não sei o que é essa coisa tua que fecha
e abre; somente algo em mim entende
que a voz dos teus olhos é mais profunda que todas as rosas)
ninguém, nem mesmo a chuva, tem mãos tão delicadas